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quarta-feira, 10 de outubro de 2012

Notícia de Jornal


 

DNA Paulistano: Morador de SP está mais estudioso, rico e medroso 
http://folha.com/no1164818



Nada me atrai. Nada me cativa. Tudo me irrita. Tudo me incomoda. A traição. Medo de andar às escuras. A Paulista se retrai e esconde-se em bueiros e zonas de meretricio. O cheiro de cola do centro velho me afeta e me faz pensar em vozes. Vosmecê quer dar uma cheirada? Penso em Ricardo Piva e em seus monstros. Volto e a Rebouças continua congestionada. Sigo em frente. Passo pela Vila Madá. Encontro os bêbados de plantão sempre a comer nas latas de lixo reciclável. Nada vezes nada. Preciso trair tudo aquilo que acredito e surge do fim do dia. O cinza de desespero. A noite chega e me corta em pedaços. Sou coberto por asfalto. Sou recolhido. Vou parar no lixão e reencontro os velhos amigos. Prédios azulados me recebem e expulsam. Sou morador de rua e vejo princesas a labutar e correr atrás de carros importados. Vejo tatuagens ridículas a esconder os podres. Vejo cultura e simulacro. O espetáculo do deslumbre e pessoas enfeitiçadas em robes de seda. Volto a andar. Entro no metrô e pulo a catraca. Não há mais latidos nem lamentações - apenas o obvio, o esdruxulo, a proparoxítona, o ditongo crescente, a palavra mal feita, o beijo não dado, a lembrança da Bela Cintra. O estrume do viaduto 9 de julho, a sujeira da capital, da metrópole. Medo de andar, medo da multidão, medo do trio elétrico. Não há mais esperança nem desejo. Nada me cativa, nada me atrai, nada me consome. Vejo duendes em cada jardim. Vejo cachorros famintos, ratos insones e sinto sua falta em doses de mentira e desespero. Não há nada mais a ser feito. A fluoxetina corre solta em direção ao rio que não existe. O Tietê me aguarda e eu vou junto. A zona de exclusão, o cinturão verde, o pobre escritor que procura entender os poetas no Wikipedia. Sigo em frente, passo pelo Paraíso, atravesso a Liberdade e desembarco no Anhangabaú. Vomito no primeiro farol e esquento no asfalto. Dou risada de mim mesmo. Patético. Corrói a minha alma ter certas lembranças. O silêncio se aproxima. Paredes altas crescem e limitam meu espaço. Corro, grito e entre lápides, decido pensar no amanhã. Creio que a Consolação está próxima e levanto para descer.